sábado, 23 de junho de 2012

Livro O que é violência contra a mulher


O NEVICOM analisou e discutiu o livro de Maria Amélia de Almeida Tales e Mônica de Melo, O que é violência contra a Mulher (2002). O resultado é possível conferir esta semana. Boa leitura!

   A violência de gênero é transversal para todas as classes sociais, e está presente em qualquer idade, nas mulheres mais novas e nas mulheres de mais idade. O apoio e as orientações são importantes para que a vítima tenha uma segurança de que possa contar com alguém

O livro de Maria Amélia de Almeida Tales e Mônica de Melo, O que é violência contra a Mulher (2002), aborda uma questão pouco discutida na sociedade, porém extremamente presente na mesma. É a violência contra a mulher em seus vários âmbitos, focando-se na violência contra o gênero. De um modo geral, a violência de gênero é praticada pelo homem para dominar a mulher, e não eliminá-la fisicamente. A intenção masculina é possuí-la, é tê-la como sua propriedade, determinar o que ela deve desejar, pensar, vestir. Ele quer tê-la sob seu controle e ela deve desejar somente a ele próprio.
Para as autoras, o tema violência contra a mulher necessita ser levado à discussão em vários aspectos da sociedade, como igreja, escola e demais locais públicos, por exemplo. Pois, há necessidade de se focar uma política pública que torne os direitos realmente iguais, ou seja, para todos. As construções culturais têm grande influencia no fenômeno da violência e tal como a dominação masculina por parte de muitas mulheres. O homem dominante, controlador, proíbe a mulher de trabalhar, fazer alguns cursos para poder trabalhar, não pode sair de casa. Na mente dele a mulher deve “servi-lo”, cuidar dos filhos, cuidar da casa, ele a quer em tempo integral.
Para Sócretes Nolasco (1995, p.17):

Primeiramente porque nos colocamos diante do que a cultura define (no plano sociológico e psicológico) o que são as características de um e de outro sexo, e, em segundo, por podermos pensar o que um homem e uma mulher devem recalcar para serem reconhecidos como homem e mulher. Se a anatomia não é um destino, ela é pelo menos um ponto de referencia e confluência das possibilidades de reconhecimento das múltiplas organizações subjetivas.

Observa-se que o comportamento editorial dos veículos noticiosos no geral, não apenas na cidade de Ponta Grossa, como em âmbito nacional, na maioria dos casos sobre violência, falta aprofundamento e contexto dos fatos, bem como uma perspectiva social à abordagem. No que diz respeito à violência contra a mulher então, esta observação é mais evidente. O fato é que este problema existe e está presente na maioria das casas dos brasileiros e em outros países. Quando é agendado algum fato, cria-se estereótipos, não se contextualizando uma questão bem mais ampla. Como Maria Amélia e Mônica acreditam que esta é uma questão política: “sensibilizar cada mulher e cada homem para que atuem na construção das tão propaladas igualdade, justiça social, cidadania, democracia, autonomia” (TALES, MELO, 2003, p. 9).
As autoras trazem que a violência numa forma geral pode ser caracterizada pelo uso da força física, psicológica, moral, sexual, patrimonial ou intelectual da qual obriga a outra pessoa a fazer algo que não seja da sua vontade, que cause constrangimento, que não seja aquilo que ela quer fazer,seja obrigada a fazer, sendo até mesmo chantageada, ameaçada. A violência contra a mulher é vivida e revivida diariamente por várias famílias, como aponta a pesquisa mais recente no país sobre violência, o Mapa da Violência realizado pelo Instituto Sangari (2012). A mesma pesquisa revela que o Paraná está em terceiro lugar no índice de homicídios, ficando atrás apenas do Espírito Santo e Alagoas. Em Ponta Grossa, os dados estaduais são espelhados.
É preciso ressaltar a participação da mulher na sociedade brasileira: a crescente busca de igualdade entre homens e mulheres (seja econômica, social, no âmbito do trabalho, entre outros) e a realidade de mulheres que vivem na violência. Para melhor ilustrar, é interessante apresentar os dados referentes à mulher, pois eles demonstram que, apesar de a mulher vir ocupando um espaço de maior visibilidade, seja no Brasil, como no mundo, a violência contra elas, violência sexual, física, psicológica, patrimonial e moral, é recorrente. Dados do último Censo do IBGE (2010) apontam que a escolaridade das mulheres permanece mais alta do que a dos homens, em relação aos anos anteriores. Porém, as mulheres com nível superior ainda recebem 60% do rendimento do sexo masculino.
Segundo dados da Folha de São Paulo, o número de deputadas estaduais e federais no país cresceu entre 30% e 40% nas eleições de 2010 em relação aos anos anteriores. Foi em apenas 1998, que o Brasil elegeu a primeira mulher a presidir a sessão do Congresso Nacional (Senadora Benedita da Silva). Já em pesquisa realizada pelo Núcleo de Opinião Pública Fundação Perseu Abramo (2001), 53% das mulheres estão na PEA (População Economicamente Ativa), e 65% delas acreditam que a vida das mulheres tenha melhorado nos últimos trinta anos.
Por outro lado, dados da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná mostram que entre 2009 e 2011 foram registrados 10,5 mil casos de violência, sendo 70% contra uma pessoa do sexo feminino. Dentro desses casos, a maioria acontece em âmbito doméstico e familiar, ou seja, seus agressores são pessoas que mantém vínculo afetivo com a vítima. No estudo Mapa da Violência realizado pelo Instituto Sangari[1] em 2012, de todos os 48.152 casos analisados no Paraná, 68,8% ocorreram em âmbito residencial, e 27,1% foram realizados pelo próprio conjugue.
A mesma pesquisa do Núcleo de Opinião Pública (2001) aponta que aproximadamente uma em cada cinco mulheres sofreu algum tipo de violência por parte de alguém do sexo masculino, e, segundo o Instituto Patrícia Galvão, estima-se que mais da metade das mulheres agredidas sofrem caladas e não pedem ajuda. Para elas, é difícil dar um basta na situação. Ainda de acordo com o Instituto Patrícia Galvão, a Central de Atendimento à Mulher (180), a qual registra queixas de violência contra a mulher, teve alta de 112% de janeiro a julho de 2010, em comparação com o mesmo período de 2009. No Paraná, foram 15.436 ligações. Contraditoriamente, em 2004, o mesmo Instituto realizou uma pesquisa de Ibope, e constatou que 82% da população brasileira acredita que não existe nenhuma situação que justifique a agressão do homem a sua mulher.
Muitas das vezes o homem dominado pelo ciúme, não deixa a mulher ter sua autonomia, controla os movimentos da companheira, não a deixando trabalhar, estudar, sair quando precisar, não ter mais relações sociais. O agressor tem domínio sobre a vítima, fazendo ela se sujeitar a ele. O domínio exterioriza-se, pelo uso da força física, mas na realidade o domínio se produz através de uma pressão psicológica sobre a vítima quando a vítima é ameaçada de morte sofre uma dominação psicológica da qual faz a vítima se sujeitar. Muita das vezes ameaças não atinge somente a mulher, mas sim aos filhos, familiares, até mesmo os seus amigos.
Quando se fala em violência, associa-se a agressões físicas ou sexuais, resultando em lesões corporais e até a morte. Porém, o que muitos não sabem, é que existem vários outros tipos de violência contra a mulher. Tales e Melo abordam, na página 11, que existem tipo de violência. Há a violência contra a mulher, a violência doméstica e a familiar. Porém todas são tratadas “como se fosse um problema muito distante, e não fizesse parte das preocupações das pessoas de bem” (TALES, MELO, 2003, p. 11). Em sete de agosto de 2006, foi sancionada a Lei Federal número 11.340, de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher, ou, como é mais conhecida, Lei Maria da Penha. Segundo a Lei Maria da Penha (2006), os tipos de violência são: física, sexual, psicológica, moral e patrimonial.
O Brasil foi um dos últimos países da América Latina (mais Caribe) a promulgar uma lei específica para os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. É, portanto, o décimo oitavo país, da lista dos vinte e um. Para a Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito da Família e Presidente da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB, Maria Berenice Dias:

A Lei Maria da Penha – mais que uma lei -, é um verdadeiro estatuto: criou um microssistema visando coibir a violência doméstica. Precioso estatuto, não somente de caráter repressivo, mas, sobretudo, preventivo e assistencialista. Nítido seu colorido de natureza criminal, ao tratar com mais rigor as infrações cometidas contra a mulher, no âmbito familiar, na unidade doméstica, ou em qualquer relação íntima de afeto (DIAS, 2007, p.98).

É preciso ressaltar que os números de violência contra a mulher não retratam a realidade. Segundo a própria Maria Berenice, a violência é subnotificada, sendo que, somente 10% das agressões sofridas por mulheres são levadas ao conhecimento da polícia. Desses, 90% dos casos acabam arquivados ou levados à transação penal. De todos os acusados, apenas 2% são efetivamente condenados (DIAS, 2007). Maria Berenice reforça que, de cada cem brasileiras assassinadas, setenta são vítimas no âmbito de suas relações domésticas, evidenciando que, ao contrário dos homens, as mulheres perdem suas vidas no espaço privado (DIAS, 2007).
A violência doméstica e familiar contra a mulher se apresenta importante para a sociedade a partir do momento em que não é somente uma questão política, cultural, policial e jurídica, mas também de saúde pública. Logo, trata-se de uma discussão que deveria ser travada em vários campos do conhecimento, seja no meio da mídia, direito, antropologia, psicologia, entre outros. Segundo dados do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (2009), o estupro e a violência doméstica são causas importantes de incapacidade e morte de mulheres em idade produtiva. A pesquisa realizada pelo Instituto Avon/IBOPE (2011), aponta que 59% dos entrevistados (do total de 1800 entrevistas) declararam conhecer alguma mulher que já sofreu agressão.
A pesquisa realizada pelo próprio NEVICOM (2009/2010) revela que em Ponta Grossa cerca de 88,95% dos agressores de mulheres registrados nas Varas Criminais são homens. A principal faixa etária destes é de 30 a 34 anos e 40 a 44 anos. Já a relação entre o autor da violência e a vítima, dos 214 agressores contados, 69 são maridos ou companheiros e 51 ex-maridos ou ex-companheiros.
A primeira delegacia da Mulher foi implantada em São Paulo, no ano de 1985. Via-se, mais de vinte anos antes da implementação da Lei Maria da Penha, a necessidade de proteção às mulheres vítimas de violência. Para a Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito da Família e Presidente da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB, Maria Berenice Dias, a sociedade, não só brasileira, cultiva alguns valores que incentivam a violência, e isso é algo “que impõe a necessidade de se tornar consciência de que a culpa é de todos. O fundamento é cultural e decorre da desigualdade no exercício do poder e que leva a uma relação de dominante e dominado”, (DIAS, 2007, p.15). Por isso, em sua visão, todos nós ainda protegemos a agressividade do masculino, o que faz construir uma imagem de superioridade (DIAS, 2007).
Para Silva (2010), Apud Documento C01,

[...] Diante dessa realidade, é patente a necessidade de adoção de medidas afirmativas em defesa das mulheres, a fim de corrigir a distorção social existente na sociedade brasileira, ainda patriarcal, uma vez que o número de mulheres vítimas de violência doméstica ou familiar, não obstante a falta de dados comparativos, é notoriamente superior ao dos homens (SILVA, 2010, p.61).

Vale ressaltar que os tipos de violência contra a mulher são:
- Violência física: É o uso da força, mediante socos, tapas, pontapés, empurrões, arremesso de objetos, queimaduras etc., visando, desse modo, ofender a integridade ou a saúde corporal da vítima, deixando ou não marcas aparentes.
- Violência psicológica: É a agressão emocional, tão ou mais grave que a física. O comportamento típico se dá quando o agente ameaça, rejeita, humilha ou discrimina a vítima, demonstrando prazer quando vê o outro se sentir amedrontado, inferiorizado e diminuído.
- Violência sexual:  Qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força, que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação.
- Violência patrimonial:  Qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.
- Violência moral ou verbal:  É qualquer conduta que consista em calúnia (imputar à vítima a prática de determinado fato criminoso sabidamente falso), difamação (imputar à vítima a prática de determinado fato desonroso) ou injúria (atribuir à vítima qualidades negativas).





[1]Mapa da Violência 2012: os novos padrões da violência homicida no Brasil. Pesquisa realizada pelo Instituto Sangari, 2012.

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